“Arrumar o homem”
Não boto a mão no fogo pela autenticidade da estória que estou para contar. Não posso porém, duvidar da verdade da pessoa de quem a escutei e, por isso, tenho-a como verdadeira. Salva-me, de qualquer modo, o provérbio italiano: “Se não é verdadeira...é muito graciosa!”
Estava, pois, aquele pai carioca, engenheiro de profissão, posto em sossego, admitido que, para um engenheiro, é sossego andar mergulhado em cálculos de estrutura. Ao lado, o filho, de 7 ou 8 anos, não cessava de atormentá-lo com perguntas de todo jaez, tentando conquistar um companheiro de lazer.
A idéia mais luminosa que ocorreu ao pai, depois de dez a quinze convites a ficar quieto e deixá-lo trabalhar, foi a de pôr nas mãos do moleque um belo quebra-cabeça trazido da última viagem à Europa. “Vá brincando enquanto eu termino esta conta” sentencia entre dentes, prelibando pelo menos uma hora, hora e meia de trégua. O peralta não levará menos do que isso para armar o mapa do mundo com um dos cinco continentes, arquipélagos, mares e oceanos, comemora o pai engenheiro.
Quem foi que disse hora e meia? Dez minutos depois, dez minutos cravados, e o menino já o puxava triunfante: “Pai, vem ver! No chão, completinho, sem defeito, o mapa do mundo.
Como fez, como não fez? Em menos de uma hora era impossível. O próprio herói deu a chave da proeza: “Pai, você não percebeu que, atrás do mundo, o quebra-cabeça tinha um homem? Era mais fácil. E quando eu arrumei o homem, o mundo ficou arrumado!”
“Mas esse garoto é um sábio!”, sobressaltei, ouvindo a palavra final. Nunca ouvi verdade tão cristalina:”Basta arrumar o homem (tão desarrumado quase sempre) e o mundo fica arrumado!”
Arrumar o homem é a tarefa das tarefas, se é que se quer arrumar o mundo.
Dom Lucas Moreira Neves, Jornal do Brasil, Jan. 1997)
01. Assinale a o item cuja afirmativa está de acordo com o primeiro parágrafo do texto:
a) Embora o autor do texto não confie na veracidade da estória narrada, conta-a por seu valor moral.
b) Como o autor do texto confia na pessoa que lhe narrou a estória, ele a transfere para o leitor, mesmo sabendo que não é autêntica.
c) A despeito de ser bastante graciosa a história narrada, o autor do texto tem certeza de sua inautenticidade.
d) O autor do texto nos narra uma história de cuja autenticidade não está certo, apesar de ter sido contada por pessoas dignas de confiança.
e) A estória narrada possui autenticidade, veracidade e, além disso, certa graça.
a) Embora o autor do texto não confie na veracidade da estória narrada, conta-a por seu valor moral.
b) Como o autor do texto confia na pessoa que lhe narrou a estória, ele a transfere para o leitor, mesmo sabendo que não é autêntica.
c) A despeito de ser bastante graciosa a história narrada, o autor do texto tem certeza de sua inautenticidade.
d) O autor do texto nos narra uma história de cuja autenticidade não está certo, apesar de ter sido contada por pessoas dignas de confiança.
e) A estória narrada possui autenticidade, veracidade e, além disso, certa graça.
RESPOSTA: "D". O primeiro parágrafo é categórico. O autor "não bota a mão no fogo" pela estória que irá contar, mas esta foi contada por alguém de confiança, já que ele não pode "duvidar da veracidade da pessoa" de quem a escutou, tendo-a "como verdadeira". Descartam-se, no primeiro momento, "A", "B" e "C". Nas duas primeiras alternativas, afirma-se que o autor não confia na estória ou em quem a contou; na terceira, diz-se que ele tem certeza da não veracidade da estória; na letra "E", ocorre o inverso da "C", colocando o texto escutado como totalmente verdadeiro.
02. O título dado ao texto:
a) representa a tarefa que deveria ser executada pelo menino;
b) indica a verdadeira finalidade do jogo de quebra-cabeça;
c) mostra a desorganização na família moderna;
d) assinala a tarefa básica inicial para a organização do mundo;
e) demonstra a sabedoria precoce do menino da estória narrada.
RESPOSTA: "D", novamente. É preciso compreender que o título do texto está em sentido figurado, aliás, a idéia geral do texto é figurativa. A expressão "arrumar o homem" tem uma abrangência muito significativa e refere-se à conscientização da humanidade. Utilizou-se a estória do menino como maneira de se chegar à mensagem que se deseja transmitir. Então "arrumar o homem" é uma tarefa básica para, também, arrumar-se o mundo. Letras "A", "B" e "E" referem-se a coisas no sentido denotativo e a letra "C" está descontextualizada com o que pede o enunciado.
03 ”...você não percebeu que atrás do mundo, o quebra-cabeça tinha um homem?” “...se é que se quer arrumar o mundo”. A palavra mundo nesses dois segmentos:
a) apresenta funções sintáticas idênticas;
b) apresenta funções gramaticais diferentes;
c) apresenta funções sintáticas diferentes;
d) possui sentidos iguais;
e) é exemplo de substantivo próprio.
RESPOSTA: "C". A função gramatical (classe de palavra) de mundo é substantivo nas duas situações (nos dois casos, o artigo indica que a classe é substantivo: ...do mundo,... = de + o mundo; ...arrumar o mundo...). Assim, descarta-se a letra "B". Os sentidos da palavra varia de uma para outra oração: no primeiro momento, mundo significa mapa, e no segundo , mundo significa o planeta Terra, por isso também descartamos a letra "D"; Na letra "E", existe um absurdo: mundo não é substantivo próprio, para sê-lo, teria de vir com inicial maiúscula; Entre "A" e "C", é só observar que na primeira oração, o termo do mundo é complemento nominal do termo atrás, na segunda oração, o termo mundo é objeto direto do verbo arrumar e, por isso, possuem funções sintáticas diferentes.
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