Ética e moralidade no Serviço Público
Costuma-se dizer que
a corrupção material é o recebimento de qualquer vantagem por prática ou
omissão de ato de ofício, e corrupção moral, a que precede a material,
porque é óbvio que, ao receber a vantagem, já ocorreu no corrompido a
deterioração de qualquer princípio de moralidade pessoal ou funcional. Tanto
uma como outra podem assumir forma ativa e passiva, porque também quem oferece
a vantagem indevida já não apresenta princípio moral.
A corrupção moral
abrange também a corrupção de costumes, a falta de caráter particular ou
nacional, o desleixo administrativo ou governamental, a falta de solidariedade
num grupo humano, a indiferença pela sorte alheia ou pelo interesse público, a
tolerância condescendente de superiores às falhas dos subalternos, filhos e
tutelados.
Corrupção não é
apenas a infração ao dever funcional praticada pelo agente público (político ou
administrativo). Não é só o suborno, a taxa de urgência, o chocolate ou a falsa
simpatia nos balcões para obter pronto atendimento. A corrupção exteriorizada
em ato costuma proceder da corrupção bem mais ampla e, no mais das vezes,
interna. Antes de ferir o patrimônio público ou particular, a corrupção degrada
os valores íntimos de cada um, relativiza o costume e a cultura da virtude,
anulando, pois, os princípios que mantêm a sociedade elevada e digna de seu
próprio orgulho.
A degradação moral
começa por pequenas concessões, pequenas inversões axiológicas em nosso dia a
dia e prossegue corroendo o homem e a sociedade. É, precisamente, a tolerância
de pequenos vícios, já na vida privada, que prepara a aceitação das grandes
corrupções na vida pública.
Se, na convivência
informal, todos já precisamos de tratos éticos, mais ainda na convivência
profissional-funcional. Assim, por força da própria Constituição Federal, a
ética passou a integrar o próprio cerne de qualquer ato estatal como elemento
indispensável à sua validade e eficácia.
Como reforço dessa
preocupação ética, a atual Constituição de 1988 também inovou no artigo 5º,
inciso LXXIII, ao incluir a moralidade administrativa entre os valores básicos
da República a serem protegidos por meio de ação popular. Segundo essa norma
constitucional, mesmo que não haja efetivo prejuízo de ordem material ao
patrimônio público, se o ato da Administração for lesivo à moralidade
administrativa, deverá ser invalidado judicialmente, via ação popular, ou
mesmo, antes, revisto administrativamente.
Cumprindo a norma
inscrita nesse dispositivo constitucional, o legislador ordinário, através da
Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992, cuidou de regulamentar minuciosamente as
hipóteses de suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a
indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário em decorrência da
prática de atos de improbidade administrativa, a qual abrange todos os atos
imorais, ímprobos ou antiéticos.
A propósito, deve ainda ser lembrado que o
legislador ordinário, normatizando sobre o assunto, através da Lei nº 8.112, de
11 de dezembro de 1990, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores
públicos, no artigo 116, inciso IX, também determina a obediência obrigatória
ao princípio da moralidade administrativa ao incluí-lo entre os deveres
funcionais dos servidores públicos.
Assim, o servidor público há de ser um ético
de plantão vinte quatro horas por dia, já por convicção (o homem é o retrato de
suas convicções), já por coerção jurídica. Até porque a consciência ética do
servidor público, nesse particular, além de restaurar a cidadania, corrige a disfunção pública no Brasil, que decorre não só da
falta de recursos materiais, mas, principalmente, da conduta muitas vezes
perversa no atendimento aos usuários dos serviços públicos, atentatória aos
direitos humanos universalmente declarados.
Nós, sociedade civil, e o Estado, há décadas, temos falhado no
processo de indução ética, pois apenas isso explica o envolvimento de tantas
pessoas em tantos atos hediondos em busca, por exemplo, de mera complementação
salarial. De diárias artificialmente pagas a obras e compras públicas no
interesse de muitos, menos no do Estado, eis o leque da corrupção que vemos no
noticiário todos os dias. O empresário corrompe o governo, e o governo corrompe
o empresário. Todos querendo ou esperando tirar alguma vantagem desse quadro sombrio.
É claro que há muitas exceções. Há empresários, homens públicos e
servidores estatais honestos por princípio. Mas o organismo contaminado anula
boas células.
Portanto, não sejamos fracos no bem a ponto de permitirmos tantos
fortes no mal. O Brasil precisa da contribuição de cada um de nós e espera que
ela seja decisiva, concreta e diária, a fim de resgatarmos a virtude na vida
brasileira.
Disponível
em: . Acesso em: 25 abr. 2012.
01. (UFRN) Do
texto, depreende-se que:
A) a
corrupção material é diferente da moral, pois somente a primeira degrada
valores, relativiza costumes e anula princípios.
B) a
corrupção material e a corrupção moral representam atitudes ilícitas, as quais,
em princípio, ocorrem de forma concomitante.
C) a
corrupção material é anterior à corrupção moral. Esta representa a deterioração
de qualquer princípio de moralidade pessoal ou funcional; aquela pressupõe
pagamento de vantagem para prática ou omissão de ato de ofício.
D) a corrupção material e a corrupção moral
podem ser caracterizadas como ativa e passiva. Em ambos os casos, esses atos
ilícitos pressupõem como criminosos tanto aquele que oferece vantagem indevida
quanto o que a recebe.
COMENTÁRIOS: O texto é enfático ao afirmar
que “Tanto uma como outra podem assumir
forma ativa e passiva, porque também quem oferece a vantagem indevida já não
apresenta princípio moral.”. Na “A”, afirma-se, indevidamente, que somente uma
delas degrada valores; na “B”, afirma-se, equivocadamente, que ocorrem
concomitantemente, ou seja, ao mesmo tempo; vimos que a moral precede
(antecede) a material; na letra “C”, inverte-se a ordem das corrupções. Sabemos
que a corrupção material sucede a moral e não o contrário.
02. (UFRN) Em
relação à sua conduta, o funcionário público
A) tem de apresentar conduta ética, balizada
por princípios pessoais ou por obediência obrigatória às leis em vigor.
B) deve
agir, no exercício profissional diário, de modo a preservar a consciência ética
dos usuários dos serviços públicos.
C) impede
a ocorrência de atos de corrupção praticados por agentes públicos (políticos ou
administrativos) quando age em obediência às leis.
D) garante
o cumprimento dos direitos humanos universalmente declarados quando realiza
atendimento adequado aos usuários.
COMENTÁRIOS.
A passagem “..., o servidor público há de ser um ético de plantão vinte quatro
horas por dia, já por convicção (o homem é o retrato de suas convicções), já
por coerção jurídica.” justifica a alternativa “A”. o vocábulo “já” – nas duas
ocorrências – indica alternância, enquanto “convicção” e “coerção jurídica”
referem-se, respectivamente, a "princípios pessoais" e "obediência
obrigatória às leis em vigor. A "B" é descartada, pois não se
preserva a consciência ética dos usuários e sim a própria consciência; a
"C" e "D" se eliminam, uma vez que não se pode nem impedir
a corrupção nem garantir cumprimento de direitos humanos, apenas por se agir
corretamente. Isso presume um conjunto de fatores e não somente a boa vontade
dos servidores públicos.
03. (UFRN) De acordo com o texto, é correto afirmar:
A) A
expressão “filhos e tutelados”, no 2º parágrafo, refere-se a parentes de
pessoas na administração pública que são favorecidos com alguma função em
órgãos estatais.
B) No
5º parágrafo, afirma-se que a ética passou a integrar a Constituição Federal,
como forma de normatizar a convivência informal e a convivência
profissional-funcional.
C) A Constituição de 1988 prevê que todo ato da Administração lesivo aos
bens públicos ou à moralidade será revisto administrativamente ou invalidado
judicialmente.
D) A
corrupção material e a corrupção moral têm a mesma procedência: a falta de
princípios éticos e a de controle mais rígido por parte da sociedade civil e do
poder público.
COMENTÁRIOS: Os candidatos
normalmente ficaram em dúvida entre “B” e “C”. Na “B”, afirma-se que “a ética
passou a integrar a Constituição Federal,...”. A Constituição Federal, em sua
essência, já presume a ética, então esta não passou a integrar aquela. A
passagem seguinte justifica a resposta como alternativa "C": “...se o
ato da Administração for lesivo à moralidade administrativa, deverá ser
invalidado judicialmente, via ação popular, ou mesmo, antes, revisto
administrativamente.”
04. (UFRN) De
acordo com o texto,
A) os
empresários, principais representantes da sociedade civil, envolvem-se em atos
hediondos em busca de complementação salarial.
B) a
aceitação das grandes corrupções na vida pública precede a tolerância de
pequenos vícios na vida privada.
C) a
corrupção degrada valores íntimos do cidadão sem, no entanto, anular os
princípios mantenedores da dignidade da sociedade.
D) é indispensável que a ética integre a
essência de qualquer ato estatal para que este seja válido e eficaz.
COMENTÁRIOS: A
passagem "a ética passou a integrar o próprio cerne de qualquer ato
estatal como elemento indispensável à sua validade e eficácia." justifica,
sem maiores dificuldades, a alternativa da resposta. Na "A", a
informação não está clara no texto; na letra "B", a ordem está
inversa; e na opção "C", afirma-se que a corrupção não anula "os
princípios mantenedores da dignidade da sociedade", o que é contrário ao
que aborda o texto.
05. (UFRN0 Na
expressão “pequenas inversões axiológicas”, o termo em destaque
A) é relativo aos valores éticos.
B) refere-se
aos axiomas sociais.
C) relaciona-se
aos direitos civis.
D) significa
degradação moral.
COMENTÁRIOS: O
termo “axiológica” diz respeito aos conceitos éticos e morais. Uma questão de
significação, em si, embora o contexto pudesse auxiliar na sua resolução. Não
há muito por que alongar-se na explicação.
06. (UFRN) Os
termos em destaque no período “[...] já por
convicção (o homem é o retrato de suas convicções), já por coerção jurídica.” estabelecem uma relação
semântica de
A) tempo.
B) alternância.
C) causalidade.
D) conformidade.
COMENTÁRIOS: Está
claro que as duas ocorrências do termo “já” podem ser substituídas por “ou...ou”,
“quer...quer” ou “ora...ora”, indicando alternância.
07.(UFRN) Observe
o período a seguir.
“O Brasil precisa da contribuição de cada um de nós
e espera que ela seja decisiva, concreta e diária, a fim de resgatarmos a
virtude na vida brasileira.” (último parágrafo
do texto).
Mantendo-se o sentido desse período, outra proposta
de reescrita em conformidade com a norma padrão é:
A) O Brasil precisa que cada um de nós
contribua para o resgate da virtude na vida brasileira e espera que essa
contribuição seja decisiva, concreta e diária.
B) O
Brasil precisa e espera que cada um de nós contribua para resgatarmos decisiva,
concreta e diariamente a virtude na vida brasileira.
C) O
Brasil espera que cada um de nós contribuamos decisivamente, concretamente e
diariamente, e precisa que resgatemos a virtude na vida brasileira.
D) O Brasil espera
que cada um de nós contribua e precisa que decisiva, concreta e diariamente
resgatemos a virtude na vida brasileira.
COMENTÁRIOS: A
expressão “que cada um de nós contribua” equivale a “a contribuição de cada de
um nós” (oração substantiva no lugar de expressão substantiva); mesma estrutura
de “para o resgate” que equivale a “para resgatar”; por último, a oração “a fim
de resgatarmos” é semelhante à expressão “para o resgate”, ambas indicada
finalidade. Questão de período composto, mascarada, com oração subordinada
adverbial final. As demais opções sempre têm um ou outro elemento que não
corresponde ao sentido da frase original.
08. (UFRN) A
seguir, encontram-se fragmentos do texto com uma explicação para o uso da
vírgula.
I. “A corrupção
exteriorizada em ato costuma proceder da corrupção bem mais ampla e, no mais
das vezes, interna.” – vírgulas utilizadas para demarcar um adjunto
adverbial deslocado
II. “[...] temos
falhado no processo de indução ética, pois apenas isso explica o envolvimento
de tantas pessoas em tantos atos hediondos [...]” – vírgula utilizada para
separar a oração coordenada sindética explicativa da coordenada assindética.
III. “Não é só o
suborno, a taxa de urgência, o chocolate ou a falsa simpatia nos balcões para
obter pronto atendimento.” – vírgulas utilizadas para separar o aposto.
IV. “Há
empresários, homens públicos e servidores estatais honestos por princípio.”
– vírgula utilizada para marcar a supressão do verbo.
A
explicação para o uso da vírgula está correta em
A) III e
IV. B) II e IV.
C) I e
III. D) I e II.
COMENTÁRIOS: Na proposição I, o termo
"no mais das vezes" é adjunto adverbial de tempo e deveria vir ao
final do período. Como está no interior da frase, considera-se intercalado
(hoje em dia as bancas estão denominando de deslocado) e isso explica as
vírgulas; Na II, a vírgula separa oração coordenada iniciada pela conjunção POIS.
Portanto, I e II já estariam corretas, configurando a resposta. Na III, não
existe aposto; na IV, o motivo das vírgulas é a separação de termos
coordenados/de mesma função ou em seqüência.
09. (UFRN) Outra
possibilidade de concordância verbal igualmente aceitável, de acordo com a
norma culta, está na opção:
A) “Nós,
sociedade civil, e o Estado, há décadas, temos falhado no processo de indução
ética [...]”.
Nós,
sociedade civil, e o Estado, há décadas, têm falhado no processo de indução
ética [...].
B) “[...]
os princípios que mantêm a sociedade elevada e digna [...]”.
[...] os princípios que mantém a
sociedade elevada e digna [...].
C) “Se, na convivência informal, todos já
precisamos de tratos éticos [...]”.
Se, na convivência informal, todos já
precisam de tratos éticos [...].
D) “Tanto
uma como outra podem assumir forma ativa e passiva [...]”.
Tanto uma como outra pode assumir forma
ativa e passiva [...].
COMENTÁRIOS: Na alternativa "A",
a segunda oração está errada, visto que o sujeito "nós" não pode
concordar com a forma "têm"; na "B", o sujeito "Os
princípios" está no plural, portanto exigindo a forma "mantêm";
a letra "D", a expressão "Tanto uma como outra" é sujeito
composto, exigindo – assim – o verbo no plural. A única alternativa que
admite duas concordâncias é exatamente a letra "C", pois a palavra
"Todos" pode tanto ser 3ª pessoa do plural (todos eles) como 1ª
pessoa do plural (todos nós), considerando a silepse de pessoa.
10. (UFRN) A
opção que apresenta o uso correto do acento grave de acordo com a norma culta
é:
A) A
tolerância de superiores à falhas de subalternos não é condizente com a ética e
a moralidade esperadas no serviço público.
B) Das diárias às obras públicas, todos os
pagamentos feitos com recursos governamentais devem obedecer aos rigores da
legislação em vigor.
C) Os
atos de convivência profissional do funcionalismo devem ser éticos e
condizentes com a moralidade à bem do serviço público.
D) Atos
estatais contaminados por corrupção são tão ofensivos que acabam por atenuar à
ação de funcionários que não se envolvem em falcatruas.
COMENTÁRIOS: Na alternativa "A",
o vocábulo “falhas” está no plural, incompatível com “a”, singular, para o uso
do acento grave; na opção “C”, a palavra “bem” é masculina, inviabilizando o
emprego do acento grave; na opção “D”, o verbo “atenuar” é transitivo direto,
isto é, sem preposição, o que proíbe o uso do acento indicador de crase. Na
alternativa “B”, a regência exige o emprego do acento de crase: “Das diárias a
+ as obras públicas”, expressão que indica origem-destino, com o emprego da preposição
“a”.
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